Aos meus professores, com carinho.

Em homenagem aos professores de Curitiba, aos de São Paulo, aos de todo o Brasil afora, vou falar dos educadores que participaram da minha formação. Do jardim de infância ao ensino médio, que na minha época eram nomeados assim: jardim, primário, ginásio e colegial. Com 5 anos tive a minha primeira professora, D. Nelma. Final dos anos 60, ela ainda carregava fortemente a estética da década. Fecho os olhos e a vejo linda, de coque e vestido evasê de fundo azul com margaridas brancas e mais duas margaridinhas penduradas na orelha. Seu toque, voz e gestos eram delicados. Seu olhar era doce e acolhedor. Um bálsamo para uma menininha enlutada e assustada. Ela me ensinou este senso estético de como se apresentar ao mundo. Da cor que podemos escolher, do belo que podemos vestir. Dizia que todas as cores eram amigas, mas que um dia ou outro, elas podiam se desentender. E claro, a década de 60 com toda sua beleza e novidade. Me mostrou também como ser suave, feminina, amorosa. Depois veio D. Risoleta, primeiro ano. Alfabetização. Minha letra, até há pouco tempo, tinha traços dela. E quando quero, ainda resgato esta letra redondinha. Ensinou a escrever com prazer. Era uma senhora, com artrite avançada, andava com dificuldades, pouca paciência e era seletiva. Aprendi com ela que o mundo é dividido entre quem tem e quem não tem. Entre as cores das peles. E de como não tratar uma criança. Afinal ela dava reguadas nos mais levados, ou descontava suas dores e cansaço em outros tantos. Nunca levei a tal reguada. Mas doía em mim cada uma que ela dava. Depois veio D. Maria do Carmo, que apesar de seca e de poucas palavras, me ensinou a amar a matemática. Veio dela a primeira compreensão desta matéria. E do primor e capricho com os cadernos. Coisa que eu já tinha comigo. Mas ela sabia reconhecer, sem alardes. D. Jalcira, era severa mas sabia ensinar. Unhas longas e vermelhas, deixava as crianças arrepiadas quando passava estas unhas no quadro negro e o som agudo entrava em nossos ouvidos. Sempre com os mesmos vestidos, porque tinham o mesmo modelo, e usava o mesmo coque. Teve um gesto desumano com um menino negro e pobre, que deu a mim e outras duas colegas, uma barra de chocolate. Aquilo ficou como um assédio e ele foi expulso da escola. Sem justa causa, reconhecido por mim e alguns poucos colegas. Ela me reafirmou que o mundo era dividido entre raças e poder econômico. Mas também me ensinou a ter mais disciplina e o gosto pelo conhecimento. No ginásio teve a D. Maria Amália, professora de história, que me fez ficar encantada com a história das civilizações e dos domínios dos homens sobre outros homens, as conquistas, cada povo com sua forma de dominar e de ser dominado. Sua maneira de contar a história era como contar um caso, um conto, algo que eu poderia alcançar, estava logo alí, na linha do tempo. Ela sentava na mesa, olhava pro vazio, como se estivesse vendo o que contava, e narrava... Me sentia companheira daquelas personagens, como se tivesse vivido cada fase da humanidade. Irmã Terezinha, era professora de português e apesar de ser muito distante do aluno e muito prática, cara fechada, gostava tanto da matéria, que acabei aprendendo um bom português de base. No fundo, era gentil. E tinha um lindo par de olhos, cor de mel, escondidos atrás do hábito e da expressão muito fechada. Paulinho, professor de química - não entendi nada de química com ele -, me ensinou, através de gestos, palavras e conversas fora da classe, que o mundo em que vivíamos podia ser transformado e que esta transformação precisava de muita doação e conhecimento histórico, filosófico e político, mas que acima de tudo precisaríamos de muita força e coragem. Ele me levou à loucura com sua química, que eu não entendia. Tiana, outra professora de matemática. Minha única professora negra. Dava aulas sorrindo e brincando. De forma que a matéria que eu já gostava, se tornou mais interessante ainda com esta alegria e leveza. Pacífico que, no último ano desta fase, me fez finalmente, compreender química. Com uma didática fantástica, tirou dos meus ombros toneladas. Afinal consegui compreender a tal da matéria. Foram muitos outros, tantos que não consigo mais lembrar de cada um. Mas tenho certeza que todos contribuíram na minha formação. No meu ímpeto jovial, muitas vezes praguejei, detestei cada um deles. Mas hoje os reconheço em mim. E tenho muita gratidão por cada um destes indivíduos, nossos professores. Graças!


Os braços da D. Risoleta, já escuros pela artrite e manchas de idade.

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